terça-feira, 16 de março de 2010

PEC: Parvos, Estúpidos e Calhaus

Imagine que precisa de pagar 15 mil euros de uma dívida qualquer. Aliás, imagine que esses 15 mil euros não são a dívida propriamente dita mas sim o montante que lhe falta todos os anos, após o que recebe de ordenado e/ou outros rendimentos, para pagar todas as suas despesas. Na verdade, as dívidas que acumulou nos ultimos vinte anos ascendem a um montante de 145 mil euros. Acha que resolve o problema se cortar 35 euros por mês (420 euros/ano) na mesada do puto? Imagine então qual seria o objectivo de uma familia responsável: reduzir as despesas para eliminar o saldo negativo de 15 mil euros e viver dentro dos seus rendimentos ou, ao invés, estabelecer como meta passar a perder apenas 4950 Euros em cada ano e ficar contente da vida?

Agora experimente acrescentar seis zeros à equação: de 15 mil euros, passemos para 15 mil milhões, o valor do déficit em 2009 (9.3% do PIB). De 145 mil euros, para 145 mil milhões (o valor da dívida pública acumulada - cerca de 87% do PIB e a aumentar). De 420 euros, para 420 milhões - o valor estimado da "poupança" prevista com as alterações ao IRS propostas no quadro do PEC. E de 4950 Euros, imagine a grande meta de 3% do PIB para o déficit: uns belos 4,950 milhões de euros/ano.

Assim parece estabelecer o plano de salvação nacional
- PEC - que além de se fazer passar pelo que não é, ignora propositadamente os efeitos da sua própria aplicação. Senão vejamos o que, por via do aumento de impostos, serão os efeitos macro económicos do PEC:

A curto prazo, aumentar impostos deixa os contribuintes com menor receita disponivel para consumo próprio e das respectivas familias. Como as poupanças são fruto do rendimento e este será menor, a médio prazo far-se-á sentir uma redução nas poupanças e, por consequência, no investimento. O aumento de impostos fará também abrandar o próprio investimento já programado, uma vez que os rendimentos expectáveis desses investimentos passarão a ser menores devido ao superior nível de taxação. Com menor poupança e investimento, a produtividade será afectada e fortemente reduzida, afectando ainda mais todos os rendimentos, incluindo os salários já prejudicados pelo aumento inicial de impostos.

As receitas dos governos têm duas grandes origens: emissão de dívida e colecta de impostos. Este esquema de financiamento exige um equilibrio apurado e sensível. A actual situação é reflexo da pressão sobre a dívida portuguesa. Quando uma familia contrai um empréstimo dá como garantia a hipoteca ou um outro bem; um governo oferece como garantia a capacidade de taxar os seus cidadãos. Medidas como o PEC visam apenas e só dar sinais aos mercados de que o governo ainda tem capacidade (e coragem) de executar essa garantia. Não é serio pensar que um exercício como o que fizemos no inicio seja considerado uma solução. Esta só poderá estar na outra face das contas do estado: num corte sério e significativo da despesa.

Aumentar impostos é o equivalente económico a "roubar a uns para dar a outros", uma vez que só quem paga efectivamente impostos (os que trabalham ou de alguma maneira criam riqueza) serão alvo de qualquer cobrança. Em 2008, de entre cerca de 4.6 milhões de familias, mais de 50% estavam nos primeiros 3 escalões de IRS, e cerca de 3.8 milhões auferiam menos de 982,00 Euros por mês BRUTOS. É fácil perceber que entre os contribuintes há os que contribuem com pagamento líquido de impostos e os que, no saldo, beneficiam dos impostos dos outros.

Existem apenas duas fontes de despesas essenciais num estado de direito: a SEGURANÇA e a JUSTIÇA. Mesmo considerando apenas um congelamento das despesas com a educação e a saúde (os eternos elefantes brancos) há ainda muito por onde cortar, sem que o país se desmanche... Haja coragem, frontalidade e INTELIGÊNCIA.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Badalhoquices

Com algum atraso, encontro um post de João Rodrigues no Arrasão sobre a Pordata. Descrevendo a base como "excelente", o autor assinala criticamente o seguinte facto: "o Estado cria ou ajuda a criar e os 'privados' ficam com os lucros ou, quando não é caso disso, com o que importa: a estima e os louros que o dinheiro consegue comprar em sociedades demasiado desiguais".
(...)

Olhando com a atenção para as fontes de Pordata, constato que a base beneficiou não apenas do trabalho de recolha e organização de dados que António Barreto fez quando estava no Instituto de Ciências Sociais (do Estado) mas também do trabalho de recolha e tratamento de dados feitos por uma multidão de instituições estatais, tais como o Banco de Portugal, o INE, vários ministérios, a Biblioteca Nacional e outras. Um escândalo, na verdade.

Só vejo uma solução: enquanto o Estado não assumir a responsabilidade de produzir uma plataforma que organize toda a esta informação e a torne acessível, os privados não lhe deveriam ter acesso para os fins que entenderem. Que é isto de comprar "estima e louros" com informação gerada com o dinheiro dos contribuintes?

(...)

Que é isso de usar competências académicas adquiridas numa sociedade demasiado desigual e dados produzidos pelo Estado para obter estima e louros na comunidade académica? Em rigor, acho que apenas o Estado deveria ter acesso aos dados que ele próprio cria ou ajuda a criar, para não haver cá badalhoquices.



Por Pedro Magalhães, no "Margens de Erro", em resposta a um "tal de" João Rodrigues, sobre o PORDATA (que se recomenda vivamente e que pode ser consultado em www.pordata.pt)

Venha e depressa, essa privatização

REN vai atribuir prémio de desempenho a Penedos com votos contra dos privados.

A REN vai atribuir, sob proposta da Parpública, um bónus a José Penedos pelo desempenho em 2009, ano em que a empresa foi envolvida no caso Face Oculta, disse à Lusa Filipe de Botton, accionista pela Logoenergia.

Esta proposta, aprovada hoje em assembleia-geral da REN, incluía o corte em 50% do montante máximo do bónus e passou com 40% de votos contra, nomeadamente dos accionistas privados. Inclui não só o ano de 2009, quando José Penedos liderava a empresa, bem como o mandato de Rui Cartaxo, que termina em 2012.

In: Jornal de Negócios, 15/03/2010